A pesquisa de resultados parciais aqui comunicados seguiu as operações técnicas, os instantes rituais e os entes envolvidos nas transformações dos alimentos em ―comidas de santo‖; privilegiando as ―comidas secas‖, que são aquelas que não envolvem sacrifício animal. Seu campo de desenvolvimento foi o contexto de fundação do Ilê Iroko Axé Opô Inle, terreiro da zona rural de Teresina, Piauí, liderado pelo babalorixá Paulo de Iroko. Daquela realidade, foram buscados os lugares estabelecidos às comidas de santo na consolidação de uma nova casa de culto candomblecista. Sob a guia dessa problemática, o avançar da pesquisa passou a colocar em perspectiva a hipótese de que aquilo que os alimentos transportavam consigo não era feito apenas das suas presenças substantivas ou das suas eficácias sutis. Pois, se os humanos e as divindades socializavam comunitariamente o banquete ritual, parecia ser razão prioritária da existência mesma dessas comidas, por sua vez, socializar a própria ―transformação‖. Dessa forma, os alimentos não são apenas passiva e tecnicamente ―modificados‖, eles também transformam aquilo que é ―unidade‖ (a comida) em ―múltiplo‖ (os corpos), permitindo-nos argumentar que onde há a transformação no candomblé, há comida de santo agindo nos seus fluxos. Assumindo tal premissa, passou-se a perceber que, para se consolidar, a nova comunidade de culto precisava provar para si mesma que sabia operar a transformação, daí a importância do apuro ostensivo da manipulação técnica e sutil dos banquetes rituais no seu interior. Tais observações foram produzidas e colocadas em experimento por um registro em estilo etnográfico das várias presenças das comidas de santo dentro do novo terreiro. Na sua orientação teórica, a proposta procurou se dispor entre e, por vezes, para além dos paradigmas do―sistema‖ e da ―ação‖ dos símbolos rituais alimentares. Testando um olhar que se guiou pela escuta e pelo acompanhamento das multiplicidades dos entes, que, quando levados a sério em campo, abriram-se a uma comunicação franca de sentidos visuais, olfativos, palatáveis e lógicos com a pesquisadora.